quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Fulano

Era um quarto vazio. Estava fechado. As pessoas jogadas no chão. Fulano enxergava como a luz: tudo amarelo. Nas paredes que o cercavam, só havia fumaça. A música alta guiava as bocas drogadas. Saiu do quarto. No corredor escuro, mais corpos sem dono, entrelaçados e violados. Sentou-se no sofá com o enjôo da bebida. Em silêncio, observou os rostos risonhos. Todos iguais.
Madrugada. Saíram do apartamento em grupos pequenos. O vento forte batendo no rosto e passos cambaleantes. Fulano sentia o corpo pesado. Os pés mal deixavam o chão, as mãos suavam, todo o corpo formigava. Parou e viu que o mar o encarava. Sem saber como, estava na praia.
Fulano sentiu sede. Sede e fome. De pizza, de sexo, de mãe. Sentou na cadeira de plástico e tragou seu cigarro. O cigarro o tragou. As luzes brancas dos postes quase o cegaram. Quanto barulho, quantos carros e buzinas. Mal percebeu que sua língua agarrava outra. O mesmo sentimento. A lúxuria bêbada e rotineira.
Nesse instrante, já não sentia os pés. Estava de novo sozinho. Os rostos alheios agora pareciam chorar. Fulano quis chorar. Afastou-se e deixou que o silêncio o levasse para casa. Deitou na cama e fechou os olhos. Agora, sentia as dores da cabeça acompanhando o ritmo acelerado do seu coração. No ouvido, um zunido quase insuportável. Nas pálpebras fechadas, um floco de neve roxo e verde. Na cabeça, o arrependimento. Virou para o lado e apagou.

Novembro de 2007.

O que faltava

Não é exatamente uma conversa que procuro. Não são desculpas pois cada um tem sua forma de superar. Não foi fácil conviver com tantas lembranças do que considerei perfeito. Não é exagero afirmar que te odiei na intensidade que te amei. Duas pessoas que se machucaram, de uma forma ou de outra. Um tempo que passou para não deixar passar o que, além de perfeito, é eterno. Nas sensações que cada figura ou sonho trás. No que se aprendeu com cada gesto e ação. Na saudade que hoje não é mais um martírio. Hoje não é conversa. Um provável agradecimento. Pelo antes, o depois e o agora. Se existe, não deve se achar a explicação para ainda ser minha inspiração. Não como o laço, não como o compromisso, mas como o simples estar perto. Há coisas que simplesmente são como são. E contra isso, não luto mais.

Espelho

Encarar-se nos olhos
Deve ser o primeiro passo.
Admitir que não é preciso pertencer
A lugar algum
Que sentir-se diferente é normal.
Entender que não há nada de errado
E que tudo passa
Que é só mais um
Porém igual à outro nenhum.