quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Primeira vez

Acordou assustada com o sonho esquisito. As dores na coxa a lembraram que acabara de dormir no chão. Sentiu frio e procurou por seu pijama amarrotado. Retirou a cinta-liga e as meias com todo o cuidado para não acordar o corpo nú deitado ao seu lado. "Deve estar sonhando", ela pensou. Pelo quarto, roupas jogadas, latas de cerveja, cama desfeita, porém vazia. Fitou, no escuro, a expressão no rosto alheio e sorriu. Depois de tantos meses, era a primeira vez que o cansaço havia falado mais alto.  A intimidade pareceu encontrar seu ápice. Ali, nenhuma ação contida, calculada, envergonhada ou habitual se manifestaria. Eram dois corpos nús sobre o edredom, dois amantes esgotados de uma noite. Ela voltou a se deitar, protegendo o corpo do frio do ar condicionado.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Esforço cobrado

Ela está ausente, trabalhando incansavelmente no desperdício. Seu valioso esforço é quase sempre descartado pela cobrança. Ela vive em um jogo de executar e deletar, suar e chorar. Quase não há comemoração, suas conquistas precisam sempre de ótimos elogios. Ela é como um muro de papel, que se acostumou a se amassar pela insegurança. Exigências que precisam morrer, uma garota que precisa respirar.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Ritual

Quando se encontram, os gestos contidos predominam por alguns instantes. Parecem recém enamorados, querendo se conhecer. Envergonhados, agem como desvendadores cautelosos, iniciantes e desajeitados. Não importa quantas vezes, a cada encontro, o mesmo ritual. Talvez seja a essência de dois eternamente apaixonados.

Improvisando

Ficamos no ritmo do improviso na madrugada. Enquanto nossas bocas colavam, nossas mãos escorregavam. Um corpo sentindo o outro, navegando entre as curvas, entrelaçando-se entre as roupas. O prazer estava ali, em sua plenitude, como jamais havia chegado. Se pudesse, congelaria o tempo naquele instante.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Sublimação

Nem toda a poesia do mundo pode comparar a sublime forma de onde vem minha inspiração e meu deleite. Sempre a alimentar meus luxuriosos e inevitáveis desejos. Se um dia inspirou medo e vergonha, agora convida-me à segurança e, sem exagero, ensina-me o verdadeiro prazer. De um jeito vagaroso e intenso, com seus olhos fixos na paixão do momento. Calafrios envolvem meu corpo ao lembrar do êxtase proporcionado. Saboreio a tradução de tal sentimento sabendo que tornará a se repetir, como um ciclo viciante e arrebatador que não deve nunca parar.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Velharia

O sorriso secreto de outra face
Não há quem desvende
Um segredo que guarda a beleza
do infinito azul
do mundo dos sonhos.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Sobre ela

Não há nada mais doce do que deitar nossos corpos nus, lado a lado, observando o teto branco e achando graça nas semelhanças físicas.
Em cada curva descubro novas pintas e marcas únicas. Seus gestos delicados, os meus desajeitados, nossos ruídos.
É ainda mais bela deste jeito. Em seu olhar vejo a mistura de anseio e carinho. Uma criança no corpo de uma mulher que sorri no centro da cama.
Pura, crua, em sua essência matriz. A beleza que jamais fugirá dos meus desejos. A imagem que os meus olhos sempre guardarão.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Luas

Um domingo como a muito não havia. Ensolarado depois de dias de chuva, parece que foi proposital. Pude sentir o cheiro dos brotos das jovens flores do quintal vizinho, que crescem com a primavera. No rádio, músicas "anos 90" compõem o clima familiar de véspera de feriado. Nem todos os sentimentos são radiantes mas, ao cair da noite, é a leveza e o sorriso no rosto que prevalecem.
Sento-me à mesa para escrever pensamentos sem importância. Em frente a um Pierrô apaixonado, ao lado dos desenhos que fiz pensando em você. Três longos dias sem comunicação me fazem consumir tintas e devorar textos. Não se deve pensar que não há mais nada à dizer. Ainda que eu tenha utilizado todos os adjetivos do dicionário, sempre haverá algo a te dedicar. Como por exemplo, um domingo.
Todos temos dependência de algum sentimento. Há mais de um ano, parte da minha felicidade nutre a expectativa de um futuro. E ao sonhar com ele, flocos de seretonina nutrem minha alma. Sinto cheiro dos móveis novos e a caixa de papelão vazia ainda com cheiro de pizza. O All Star vermelho próximo à porta e nossa arte pela sala. Sem espaço para a ausência. Nem aos domingos, nem em nenhum outro dia.
Há mais de um ano, você é como um presente, que nunca perdeu o laço da embalagem. Toda vez que abro o pacote, continuo contemplando como se ainda estivesse embalado. Eu conheço os segredos mas mantenho o mistério; um feitiço que o cotidiano não apagou. Este domingo é dedicado aos três meses de sete de mais de um ano. A lua iluminada no céu é minguante, mas nós sabemos que sua forma é sempre cheia.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Todo o meu amor



"Acho que amor mais denso que esse não tem.


Não é amor de amigo, de amante...
É todo o amor que tenho!
A cada dia te descubro mais meu
mas não com tom de posse e sim de reconhecimento.

acho uma delícia quando você esquece os olhos em cima dos meus..."

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Paixão

Danço ao som de uma valsa muda
Somos o par no centro do salão
As cores que iluminam a noite são nossas almas doces.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Mãos dadas

O tipo de amor que não quer mesmo morrer
Que é para sempre, com troca de alianças.
Um amor que é, acima de tudo, amizade
Mas não só isso.
Ele quer ser amante
Quer estar no entrelaçar dos corpos
Na dança do prazer
Ele quer ser.

sábado, 5 de setembro de 2009

Ciclo

Cotidiano que gira em torno de controle; o que pode, o que não pode. Lições a serem aprendidas são deixadas para o amanhã, que nunca chega. Quem sou eu, quem somos nós? Sombras chamadas de corpos, perambulando, em busca de sucessos que ninguém provou ser verdade. Liberdade só no dicionário. Somos almas acorrentadas, umas as outras, girando em torno de conceitos. Eu sou um círculo, somos todos um ciclo. Sem fim, perdidos e com medo da consciência - nossa própria sentença.

Citalopram e Benzodiazepina

Tome um comprimido e arrume o quarto. Reveja seus amores e vícios. Tome outro comprimido e deseje que tudo torne-se padrão. Reveja seus conceitos e perceba que as coisas só mudarão com um afastamento. Tome um comprimido e durma.

Ironia

Absorva tudo o que for capaz
Dores e amores
Esqueça o filtro - disassocie-se
Absorva todos os rumores
Absorva as dores.

Aqui

O corte - a dor
A pele, o sangue, o ardor
Sentimento de vida.

Marcas e volumes na epiderme
No sofrimento, o prazer
no prazer, o alívio do sofrimento.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

O que ninguém vê.

Quando se calam, o silêncio é quem parece gritar e surtar.
Inquietante, frio e cortante.
Por que ninguém responde?
Há algo a ser dito
Há algo a ser dividido
Medo, vergonha e covardia.
É o que ninguém vê.
Quando se calam,
Não é como um conforto
Não é como um carinho
Que tantas vezes, no silêncio se revela
Não existe rumo nem plano.
Quando estão calados parecem lutar com o tempo
Na esperança de logo passar
O nervosismo
O incômodo.
Eles são como ninguém vê.
Distantes e desconhecidos,
Se calam querendo se conhecer.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Fulano

Era um quarto vazio. Estava fechado. As pessoas jogadas no chão. Fulano enxergava como a luz: tudo amarelo. Nas paredes que o cercavam, só havia fumaça. A música alta guiava as bocas drogadas. Saiu do quarto. No corredor escuro, mais corpos sem dono, entrelaçados e violados. Sentou-se no sofá com o enjôo da bebida. Em silêncio, observou os rostos risonhos. Todos iguais.
Madrugada. Saíram do apartamento em grupos pequenos. O vento forte batendo no rosto e passos cambaleantes. Fulano sentia o corpo pesado. Os pés mal deixavam o chão, as mãos suavam, todo o corpo formigava. Parou e viu que o mar o encarava. Sem saber como, estava na praia.
Fulano sentiu sede. Sede e fome. De pizza, de sexo, de mãe. Sentou na cadeira de plástico e tragou seu cigarro. O cigarro o tragou. As luzes brancas dos postes quase o cegaram. Quanto barulho, quantos carros e buzinas. Mal percebeu que sua língua agarrava outra. O mesmo sentimento. A lúxuria bêbada e rotineira.
Nesse instrante, já não sentia os pés. Estava de novo sozinho. Os rostos alheios agora pareciam chorar. Fulano quis chorar. Afastou-se e deixou que o silêncio o levasse para casa. Deitou na cama e fechou os olhos. Agora, sentia as dores da cabeça acompanhando o ritmo acelerado do seu coração. No ouvido, um zunido quase insuportável. Nas pálpebras fechadas, um floco de neve roxo e verde. Na cabeça, o arrependimento. Virou para o lado e apagou.

Novembro de 2007.

O que faltava

Não é exatamente uma conversa que procuro. Não são desculpas pois cada um tem sua forma de superar. Não foi fácil conviver com tantas lembranças do que considerei perfeito. Não é exagero afirmar que te odiei na intensidade que te amei. Duas pessoas que se machucaram, de uma forma ou de outra. Um tempo que passou para não deixar passar o que, além de perfeito, é eterno. Nas sensações que cada figura ou sonho trás. No que se aprendeu com cada gesto e ação. Na saudade que hoje não é mais um martírio. Hoje não é conversa. Um provável agradecimento. Pelo antes, o depois e o agora. Se existe, não deve se achar a explicação para ainda ser minha inspiração. Não como o laço, não como o compromisso, mas como o simples estar perto. Há coisas que simplesmente são como são. E contra isso, não luto mais.

Espelho

Encarar-se nos olhos
Deve ser o primeiro passo.
Admitir que não é preciso pertencer
A lugar algum
Que sentir-se diferente é normal.
Entender que não há nada de errado
E que tudo passa
Que é só mais um
Porém igual à outro nenhum.